terça-feira, 18 de novembro de 2008

As senhoras do ônibus

Todo mundo deveria andar de ônibus pelo menos uma vez. Andar de ônibus é um aprendizado, uma lição de vida. Eu, particularmente, prefiro os assentos mais centrais, não muito à entrada, tão pouco à saída do veículo. É de lá que o passageiro mais observador vai assistir às cenas mais curiosas e ouvir os diálogos mais absurdos.

Uma vez, sentaram atrás de mim, duas garotas, 11, 12 anos no máximo, e elas começaram a tagarelar incessantemente sobre todos os conhecidos delas. Meu Deus, não deve ter faltado um! Pelo menos assim dizem meus ouvidos e minha paciência. Depois as meninas, aquelas duas crianças, se puseram a falar de namorados, até de ex-namorados. Eu nem sabia que meninas de 11 anos namoravam. Viagens de ônibus são muito úteis quando se quer saber a quantas anda o progresso social.

Mas não são as adolescentes que me interessam, ou as crianças e as Balzaquianas. As personagens mais interessantes sempre serão as senhoras, de todos os tipos e tamanhos e graus de prolixidade. Em geral, as avós são simpáticas e falantes. Principalmente falantes. Essas mulheres que já passaram por tantos anos, que já experienciaram os mais diversos acontecimentos da cidade, quem sabe do mundo, e que, ao chegar à certa idade sobem nos ônibus, preferencialmente pela porta da frente, escolhem um assento entre os primeiros, também preferencialmente, e se põe a falar e nos ensinam tantas coisas.

Não é que os homens não andem de ônibus ou que eu os tenha deixado de lado despropositadamente. Mas eles preferem ficar em silêncio, aguardando sua parada para então descer. Quando não, eles puxam papo com o motorista, ninguém mais. Os senhores, estes sim dariam uma história, mas isto ficará para uma próxima crônica. Hoje vou deixá-los quietos olharem entretidos a paisagem que corre pela janela.

Volto então para as senhoras. Quando sozinhas, elas tratam rapidamente de puxar papo com o vizinho. Nunca seremos nós, passageiros observadores, premiados com tal honra, mas a nós nos basta ouvir. Ouvir e assimilar tudo o que o ônibus nos conta. Outro dia entreouvi, já pelo meio, a conversa entre uma senhora muito religiosa e um rapaz. Qual era a Religião eu não sei, mas ela acreditava em Deus e em nome Dele pedia que o “rapazinho” tivesse juízo, que seguisse pelo caminho do bem. Dizia que este mundo estava perdido, mas que se nós acreditássemos em Deus e fôssemos bons, tudo ficaria melhor.Eu acredito muito nas senhorinhas. Principalmente naquelas que pegam o ônibus.

Vez ou outra, as senhoras pegam o ônibus em duplas, até em trios. Aí então é uma festa. Foi em uma dessas vezes que eu aprendi, ainda muito nova, como não borrar os dentes com batom. “É só tirar o excesso com o dedo, assim!”, e a de cabelo loiro, recém-tingido, punha o dedo entre os lábios e tirava o excesso de batom. Quem observa, observa desde cedo e erra menos, é o que eu digo.

Só sei que quando sobem nos ônibus aquelas senhoras tão cheias de coisas para ensinar que mal conseguem esperar que a porta pela qual entraram se feche e algum passageiro lhes ceda aquele lugarzinho especial, tão reservado para elas, e já estão falando, só sei que aí, nessa hora, paro tudo que eu estiver fazendo, abandono minhas leituras de viagem ou as outras conversas de ônibus e lhes concedo toda a atenção que se pode ter. Porque não se aprende mais em lugar algum como se aprende com as senhoras dos ônibus. E quanto mais longo for o trajeto, melhor. Eu, que sempre morei longe dos meus destinos, um dia vou ter muitas histórias para contar.